Recentemente, em algumas cidades do Brasil e no Rio de Janeiro, com maior incidência, uma onda de caso de profissionais de enfermagem que são flagrados sob a prática reprovável de aplicarem as chamadas ”vacina de vento” em idosos. Ato que se constitui pela ação de efetuar a picada da agulha em pacientes, sem pressionar êmbolo da seringa para inocular a substancia imunizante.
Diante desses fatos, amplamente noticiados pela imprensa local e mundial, como um produto genuinamente brasileiro, as perguntas que nos fazemos são as seguintes: estas atitudes fazem parte de um plano de conspiração, arquitetado individualmente ou coletivamente? Estamos diante de uma ação criminosa individual, planejada pela mente perversa, que se alimenta da maldade, pelo prazer do sofrimento alheio? Ou ainda, é resultado da falta de conduta ética de alguns profissionais que não tem qualquer compromisso com a vida?
Se uma conspiração, as ações objetivam justificar ou fortalecer a narrativa de baixa eficácia dos imunizantes, corroborando para desacreditar o potencial imunizante das vacinas, pois as pessoas que foram enganadas, que simularam tomarem a vacina, apareceriam mais adiante infectadas pelo Coronavirus, demonstrando que não valeria apenas se vacinar e que o negacionismo e os grupos antivacina estariam corretos em seus pressupostos. Colocando em dúvida a ciência, os pesquisadores e os laboratórios que pesquisaram e produziram os imunizantes.
Se acreditarmos que os fatos são decorrentes de uma ação criminosa e individual do agente vacinador, sem nenhuma justificativa, o fazer pelo fazer, o que tornaria o fato ainda mais gravíssimo, porque esses profissionais estariam se desumanizando, não estariam respeitando os mais basilares dos direitos, o direito à vida, nos leva a uma reflexão profunda sobre nossa existência e nosso papel social.
Mas se por outro lado, esses profissionais ao simular a vacinação, buscam desviar as doses para proveito próprio, para aplicar em parentes e amigos, ou ainda, para obter vantagens financeiras com o repasse, estamos diante de uma situação de flagrante desrespeito aos preceitos ético da profissão.
a verdade, seja qual o motivo apresentado, essa tragédia humana nos atingiu e virou caso de polícia, em algumas cidades já temos profissionais de enfermagem sendo indiciados em Inquérito Policias. A ação criminosa vem sendo tipificada no Código Penal Brasileiro (CPB) com base no Cap. III – Dos Crimes Contra a Saúde Pública, Art. 268, vejamos:
Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.
Notadamente, não será possível a aplicação do Paragrafo Único, com aumento de pena, em razão de serem os autores investigados ou indiciados até o momento, Técnicos de enfermagem, e assim, entre outras hipóteses, não serem considerações profissionais liberais e trabalharem sob a tutela de outro (enfermeiro), na linha de subordinação.
A outra hipótese de enquadramento tem como base a incidência do crime de Peculato, previsto no Título XI, Dos Crimes Contra a Administração Pública, Capitulo I, Dos Crimes Praticados por Funcionários Publico Contra a Administração Pública, previsto no Art. 312 do CPB:
Art. 312 - Apropriar-se o
funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou
particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito
próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze
anos, e multa.
§ 1º - Aplica-se a mesma
pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou
bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou
alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de
funcionário.
Peculato culposo
§ 2º - Se o funcionário
concorre culposamente para o crime de outrem:
Pena - detenção, de três meses a
um ano.
§ 3º - No caso do parágrafo
anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade;
se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.
Peculato mediante erro de outrem
Para o enquadramento no crime de peculato é necessário que o agente tenha, conforme a doutrina, sido alcançado por uma das espécies: Peculato apropriação (artigo 312, parte 1); Peculato desvio (artigo 312, caput, parte 2); Peculato furto (artigo 312, parágrafo 1º); Peculato culposo (artigo 312, parágrafo segundo). No entanto, as noticias das investigações, embora seja muito cedo ainda, não apontam para as qualificadoras ou para o aumento de penas. Isso porque ainda não ficou claro um elemento fundamental do enquadramento, a finalidade da apropriação ou do desvio.
Imaginemos que as ações livres e deliberadas desses profissionais, que guardam um condição especial, fazem parte de uma categoria que dispõe de leis especifica que regulamenta a profissão, a lei 7.498/1986, nos termo do Art. 2º Parágrafo único:
Art. 2º – A Enfermagem e suas
atividades Auxiliares somente podem ser exercidas por pessoas legalmente
habilitadas e inscritas no Conselho Regional de Enfermagem com jurisdição na
área onde ocorre o exercício.
Parágrafo único. A Enfermagem é
exercida privativamente pelo Enfermeiro, pelo Técnico de Enfermagem, pelo
Auxiliar de Enfermagem e pela Parteira, respeitados os respectivos graus de
habilitação.
Razão que nos remete a outra dimensão do problema, mais ligado a maneira introspectiva de analisar as condutas humanas, e nestes casos, a ética profissional, fortemente fundamentada na moral e nos bons costumes, nos valores morais que norteiam as condutas humanos. Surgem, assim, questões importantes dentro do sistema de freios e contrapesos, sob a responsabilidade dos Conselhos de Enfermagem, órgão que entre outras funções são responsável pela guarda do exercício ético da enfermagem, protegendo a sociedade dos maus profissionais.
Neste aspecto é da alçada dos conselhos investigar e aplicar penalidades a condutas ética danosa a sociedade, surgindo por força do ordenamento jurídico do Sistema Cofen/Conselhos Regionais, a obrigação dos conselhos regionais iniciar processo éticos sem a formalização de denúncia por terceiros interessados, bastando tão somente a noticia do fato se tornar publico, conforme o Título II, Capitulo I, Art. 18 da Resolução Cofen 370/2010:
Art. 18. Inicia-se de ofício quando o Presidente do Conselho vier a saber, através de auto de infração, ou por qualquer meio, de fato que tenha característica de infração ética ou disciplinar.
Caso o conselho incida na dissidia de não aplicar a legislação em vigor, seu presidente responderá pelo crime de prevaricação, tipificado no Art. 319 do CPB;
Art. 319 - Retardar ou deixar
de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição
expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:
Pena - detenção, de três meses a
um ano, e multa.
Isso em razão de já esta pacificado, que os conselhos de profissões são autarquias federais e, portanto compõe a Administração Pública, obrigado seus gestores ao cumprimento da legislação aplicada à Administração Pública. Ao analisar as condutas éticas, essas autarquias se obrigam ao devido processo legal a ampla defesa e ao contraditório, sendo órgãos legítimos para processar e julgar os profissionais de enfermagem, conforme o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem (CEPE), Resolução 564/2017, especialmente o Art. 2º:
Art. 2º Este Código aplica-se aos Enfermeiros, Técnicos de Enfermagem, Auxiliares de Enfermagem, Obstetrizes e Parteiras, bem como aos atendentes de Enfermagem.
Ao realizarem seus julgamentos, e aplicar suas sanções, devem levarem em consideração, sem deixar de observar outros normativos legais a aplicação do Art. 110 do CEPE, Resolução 564/2017, Art. 110 o seguinte:
Art. 110 - Para a graduação
da penalidade e respectiva imposição consideram-se:
I – A gravidade da infração;
II – As circunstâncias agravantes
e atenuantes da infração;
III – O dano causado e o
resultado;
IV – Os antecedentes do infrator.
Pelo que vimos nas redes sociais e nos noticiários nacionais, as acusações apontam para as incidências de um conjunto de artigos previstos no CEPE, tais como 41, 48, 61, 64, 72, 74 e 87, no entanto, deixamos claro que essa é uma avaliação muito particular, e não reflete a verdade dos autos, cabendo aos conselheiros relatores a liberdade de qualificar os acusados.
Entretanto, caso fique constatado a aplicação desses artigos, os profissionais que forem apenados, poderão sofrer desde uma censura nos termos dos artigos, 41 e 41, suspensão do exercício profissional nos termos dos Art. 41, 61, 64, 72 e 74 e por fim uma cassação do direito de exercício profissional, Art. 72, 74 e 87. Além das sanções aplicadas, estas podem cumular com pena de multa, que variam no valor de 1 a 10 anuidades pala incidência dos Art. 41, 48, 61 e 87.
Os atos praticado por maus profissionais devem serem punidos com o rigor da lei, pois atentam contra a vida, a dignidade das pessoa, mancham a imagem das instituições e maculam os conceitos da profissão. Na sociedade atual não há espaço para atos vis, irresponsáveis, que vise proveito próprio ou que em nome de ideologia seja nocivos à vida.
A enfermagem durante está pandemia e no seu mister diário não pode ser balizada pelos atos desumanos e criminosos de um quantidade mínima de profissionais, que agindo às margens da lei, de forma descompromissada, expõe toda categoria.
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